A Bíblia permite a doação/transplante de órgãos e transfusão de sangue?
- 10/12/2024
E, posto que a minha enfermidade na carne vos foi uma tentação, contudo, não me revelastes desprezo nem desgosto; antes, me recebestes como anjo de Deus, como o próprio Cristo Jesus. Que é feito, pois, da vossa exultação? Pois vos dou testemunho de que, se possível fora, teríeis arrancado os próprios olhos para mos dar (Gálatas 4:15, 15 ARA). - Paulo
Na época de Paulo não havia doação de órgãos, nem tampouco, transfusão de sangue, mas diante de uma situação que muitos estudiosos acreditam que poderia ser uma ‘grave doença nos olhos’, ou não, nota-se que os ouvintes sentiram tamanha compaixão que estavam dispostos a doar as próprias ‘córneas’!
Sei, que você pode estar pensando, que estou forçando a barra nessa hermenêutica, mas a questão não é essa, Deus enviou o seu filho unigênito, Jesus, que deu a própria vida (João 3:16) por nós, o que seria um órgão para se dar?
Há temas que não deveriam ser polêmicos, mas diante de uma humanidade de mais de 8 bilhões de pessoas, é difícil ter consenso. Diante disso apresento um resumo das perspectivas bíblicas, opiniões de especialistas e a análise cultural sobre a doação/transplante de órgãos e transfusão de sangue ao redor do mundo, não com o intuito de torná-la a favor ou contra, mas para que facilite sua compreensão e escolhas futuras com consenso e coerência.
Não há nenhum versículo na Bíblia que diretamente oriente acerca (ou contra) a a doação de órgãos ou transfusão, entretanto, há os que mostram o amor, o cuidado com a vida ou atos de bondade, como:
Ame o seu próximo como a si mesmo (Levítico 19:18).
Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a sua vida pelos seus amigos (João 15:13).
Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente na angústia (Salmo 46:1).
A cura de enfermos era central no ministério de Jesus, como em Lucas 9:2: Ele os enviou a pregar o Reino de Deus e curar os enfermos.
Portanto, enquanto temos oportunidade, façamos o bem a todos (Gálatas 6:10).
Os versículos bíblicos acima têm sido muito utilizados a favor da doação/transplante de órgãos e doação de sangue, mas há interpretações contrárias, como: o respeito ao corpo e proibição do consumo de sangue, como:
Não sabeis que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo? (1 Coríntios 6:19) Algumas tradições cristãs e não-cristãs argumentam que o corpo deve ser preservado integralmente, inclusive após a morte.
Não comam sangue, porque a vida está no sangue (Levítico 17:11). Algumas instituições religiosas e filosóficas, como as Testemunhas de Jeová, interpretam isso como proibição da transfusão de sangue. Note que não se fala em transfusão, mas alimentar-se de sangue, é um termo em que à época da Bíblia não existia ainda, porém são totalmente distintos.
No Cristianismo há linhas diferentes de pensamentos e opiniões, algumas segue o pensamento do Judaísmo e afins, como o Pikuach Nefesh, i.e., princípio de salvamento de uma vida, ou boa ação, um ato de justiça (mitzvá). Nessa ótica a preservação da vida é superior aos preconceitos, superstições e tabus. A Ciência e a razão, no temor do Senhor, podem ser aplicadas. Como está escrito no Talmude, salvar uma vida é como salvar o mundo inteiro (Sanhedrin 37a).
Jesus ele fala que o sábado não é maior que a vida (Marcos 2:27-28). Os próprios comentários judaicos, como a Mishná apontam para isso, que é permitido ‘quebrar’ o Shabat (guarda do Sábado judaico) para salvar uma vida. Nessa ótica se é permitido a reanimação cardiopulmonar (RCP) que visa reverter uma parada cardiorrespiratória (PCR), e até a aplicação de outros procedimentos invasivos.
Inúmeros teólogos e rabinos concordam com a doação de órgãos post-mortem, desde que o órgão seja retirado somente com a certeza da morte e respeitando o corpo, tal como a transfusão de sangue que é também sancionada, por ser uma forma de salvar vidas.
Os que não concordam afirma que o corpo não pode ser ‘violado’ após à morte, mas tem que estar íntegro, e ser enterrado intacto, usando o versículo de Deuteronômio 21:23, entretanto é uma interpretação e não lei. Alguns discordam com a doação porque acreditam que não se sabe ainda o momento exato em que a morte ocorre (no momento em que o coração para ou com a morte cerebral?), causando polêmica e aflição. Se torna uma questão mais filosófica e conceitual do que prática que a própria medicina já tem sua opinião.
A grande realidade é que a maioria dos Cristãos, Judeus e especialistas concordam com a doação de órgãos e transfusões para salvar vidas, com destreza e respeito pelo corpo.
Quais as vantagens e desvantagens para doar órgãos e transfusões?
Salvar vidas: Doação de órgãos e transfusões são frequentemente a única solução para doenças terminais ou emergências médicas.
Melhoria da qualidade de vida: Pacientes podem viver por anos com transplantes bem-sucedidos.
E pelo contrário:
Riscos de rejeição e infecção: Transplantes podem falhar, e transfusões têm riscos de transmissão de doenças (reduzidos com avanços médicos).
Dilemas éticos: Definição de morte e coerência com crenças religiosas.
A evolução da biotecnologia
Transplante de órgãos artificiais: Corações artificiais e bioimpressão de tecidos estão avançando.
Sangue artificial: Pesquisas em sangue sintético e substitutos do plasma reduzem dependência de doadores.
Técnicas aprimoradas: Equipamentos como ECMO (oxigenação por membrana extracorpórea) ajudam a preservar órgãos.
Entretanto há casos críticos que necessitam de intervenção, como:
Doação de órgãos:
Insuficiência renal, hepática ou cardíaca terminal.
Lesões irreversíveis na córnea ou queimaduras graves.
Falência múltipla de órgãos.
Doenças terminais.
Lesões traumáticas graves.
Transfusão de sangue:
Perda grave de sangue (hemorragias severas) em traumas ou cirurgias complexas.
Pacientes com anemia grave ou leucemias.
Tratamentos oncológicos.
Esses temas continuam a evoluir com avanços científicos e interpretações religiosas. Uma abordagem equilibrada deve levar em conta os valores espirituais, éticos e médicos para promover a vida e o bem-estar.
A tecnologia médica avançou significativamente na área da doação de órgãos e transfusões. Métodos modernos permitem realizar cirurgias complexas sem necessidade de transfusões, utilizando técnicas como conservação do sangue e cirurgia sem sangue. Isso se tornou uma prática padrão em muitos hospitais, devido ao aumento de pandemias, bactérias etc., que têm levado a um alerta sanitário para o cuidado extremo nesses procedimentos invasivos. Além disso, os critérios para determinar a morte cerebral foram refinados, permitindo uma abordagem mais ética para a doação.
A decisão é pessoal, não bíblica. A escolha é particular, não religiosa. Se você é favor não critique que não concorda e vice-versa. Sei que há vontade de interferir na vida dos outros, mas cabe à lei sumária da constituição ou aos órgãos competentes resolverem essas questões, se depender de vós, tenha paz com todos.
Ser a favor não é maldição ou pecado, mas ato de amor e mitzvá.
Maranata ora, vem Senhor Jesus!
Fernando Moreira (@prfernandomor) é pastor na Igreja Batista do Povo em Vila Mariana - SP. Bacharel em Ciência da Computação e Teologia. Mestrado em Ciência da Computação. Doutorado em Teologia e MBA em Vendas, Marketing e Geração de Valor. É membro da Academia de Letras, Artes e Cultura do Brasil, associado do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), executivo de tecnologia, mentor de carreiras executivas, conselheiro administrativo, palestrante, conferencista e autor de vários livros.
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